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Preços dos grãos de café duplicaram no ano passado (e podem voltar a duplicar)

Os preços dos grãos de café duplicaram no ano passado e há um sério risco de que possa voltar a acontecer o mesmo este ano. Afinal, o que se passa na indústria do café?

O Dia Internacional do Café parece muito diferente este ano. Introduzido pela Organização Internacional do Café (OIC) a 1 de outubro de 2015 para aumentar a consciencialização sobre o produto e os desafios enfrentados pelos produtores, o dia normalmente concentra-se em como os preços baixos pagos pelos grãos não torrados mal cobrem os custos dos agricultores — quanto mais sustentar as suas famílias.

Mas não este ano. Nos últimos 12 meses, o preço C — o preço de referência para o café Arábica na Bolsa de Nova Iorque — subiu de 1,07 dólares por cerca de meio quilograma para cerca de 1,95 dólares. Já em julho, atingiu os 2,08 dólares.

Quase todos os contratos de entrega de café são comparados ao preço C, com o resultado de que os preços do Arábica verde (grãos não torrados) aumentaram mais de 80% durante o ano passado. As do café Robusta — uma alternativa mais barata e menos saborosa — aumentaram mais de 30%. E há todas as probabilidades de que esses preços subam ainda mais nos próximos meses. 

O principal motivo do aumento dos preços é uma série de eventos ambientais no Brasil. De longe o maior produtor de café do mundo, o Brasil é responsável por cerca de 35% da colheita mundial.

O volume de produção oscila regularmente e, regra geral, isso não é suficiente para afetar muito os preços, porque os produtores mitigam os seus riscos através da gestão de reserva e proteção dos preços no mercado de café.

No entanto, os rendimentos em 2021 provavelmente serão dramaticamente mais baixos. Isso deve-se a uma combinação de uma forte seca no início da estação, que reduziu o número de “cerejas” do café, e geadas intensas recentes que podem danificar ainda mais os frutos e até mesmo as árvores.

A grande questão é como é que isto afeta a produção futura. Os cafeeiros podem levar até cinco anos para amadurecer, portanto, levará algumas estações para que a escala dos danos fique clara.

Se a geada causar danos máximos — potencialmente atingindo dois terços das árvores — pode haver uma queda duradoura no fornecimento mundial. Isto pode fazer com que os preços ultrapassem a barreira dos 3,00 dólares até aos 4,00 dólares.

O problema do Robusta

Os preços do café caíram no final da década de 2010, principalmente como resultado da expansão da produção mundial. O mais notável foi o Vietname, que agora é o segundo maior produtor de café do mundo e responde por cerca de 18% da produção global total. Até 95% da produção vietnamita é composta por Robusta.

Na realidade, o Robusta foi usado pela primeira vez para o cultivo de café por causa de uma catástrofe ambiental, quando a produção de café do Leste Asiático foi virtualmente eliminada pela ferrugem do café durante o final do século XIX.

Mais recentemente, os procedimentos de “limpeza” do Robusta para reduzir os sabores estranhos melhoraram a tal ponto que os torradores recorrem cada vez mais ao aumento da sua proporção dentro de uma mistura. Isto é feito principalmente quando se procuram mercados que são principalmente movidos pelo preço, como o café instantâneo.

Se os preços continuarem a subir agora, o uso de mais Robusta nas misturas pode evitar que o café se torne muito caro para os consumidores. Mas isto será difícil de fazer, pelo menos a curto prazo, devido às severas restrições da covid-19 no Vietname.

Isto causou interrupções consideráveis no transporte de café das terras altas centrais para o centro de exportação da cidade de Ho Chi Minh e, de seguida, na gestão da logística de transporte. Os mesmos problemas surgiram em muitos países produtores de café.

Consequentemente, há corretores da bolsa a lutar para garantir reservas suficientes, produtores a pensar em como passar os aumentos de preços aos seus clientes comerciais e consumidores a enfrentar a perspetiva de pagar preços mais altos por produtos domésticos de café.

Mas serão os produtores os vencedores neste último aumento de preços? O agronegócio brasileiro que sobrevive ao impacto imediato das geadas certamente sobreviverá, assim como as quintas médias e bem capitalizadas da América Latina.

Mas o que dizer dos pequenos proprietários e agricultores de subsistência que representam 95% dos cafeicultores? Durante anos, a OIC e os seus Estados membros apresentaram esses agricultores como vítimas das forças do mercado global; agora descobriremos se estes são capazes de devolver aos agricultores o valor agregado que o seu café está a gerar. Neste caso, o Dia Internacional do Café será realmente algo para comemorar.

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