Ascensão e queda. Como um economista ganhou 14 vezes a lotaria — e perdeu tudo

Stefan Mandel / Twitter

Stefan Mandel ganhou 14 vezes a lotaria — e perdeu tudo

O economista romeno Stefan Mandel descobriu um método único para ganhar na lotaria — algo que conseguiu fazer 14 vezes. No entanto, aos 89 anos, está na ruína.

É quatro vezes mais provável ser atingido por um raio ou ter quadrigémeos do que ganhar a lotaria.

Mas para Stefan Mandel, economista romeno nascido em 1934, estas regras não se aplicavam.

Nos anos 60, Mandel passava por tempos difíceis. A viver na Roménia comunista de Ceausescu, o seu salário era o equivalente a 76 euros mensais, escasso para quem tinha duas filhas e uma mulher, e o dia-a-dia na miséria e na pobreza faziam-no ambicionar por mais.

Muitos daqueles que, tal como Mandel, viviam no mesmo dilema e ambicionavam mais conforto na vida, viraram-se para vidas de crime — algo que Stefan Mandel conseguiu evitar focando-se na… lotaria.

Com um dom natural para números, o economista gastava todo o seu tempo livre a analisar documentos teóricos sobre probabilidade escritos no séc. XIII por Leonardo Fibonacci.

Depois de anos de pesquisa, Mandel criou um algoritmo de escolha de números baseado num método que apelidou de condensação combinatória, com o qual  afirmava conseguir prever 5 dos 6 números da lotaria, reduzindo o número de combinações possíveis de milhões para milhares.

Mandel percebeu também que, por vezes, o custo de comprar todos os números suficientes para jogar todas as combinações possíveis era menor do que o prémio do jackpot — conseguindo assim obter lucro certo.

Por exemplo, se um jogo exigisse acertar em seis números entre 1 e 40, haveria 3.838.380 combinações de números possíveis — e se o custo de jogar em todas essas combinações fosse inferior ao prémio, o investimento daria lucro.

Com estes argumentos fortes, o economista convenceu amigos e conhecidos a formar um “sindicato de lotaria” que, se o prémio justificasse, apostava em grandes quantidades de bilhetes de lotaria, de modo a cobrir todas as combinações possíveis.

Para surpresa de muitos (mas não todos), o sindicato de Mandel conseguiu ganhar o primeiro prémio da lotaria, na altura num valor de quase 17 mil euros.

Depois de pagar as suas despesas e as comissões aos membros do seu “sindicato”, Stefan ficou com quase 3 mil e 500 euros — o lucro que o seu esquema tinha rendido.

Com esse dinheiro, conta o New York Post, Mandel subornou funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros e fugiu da Roménia, à procura de uma vida nova — e de um jackpot ainda maior

Depois de 4 anos a vaguear pela Europa, Stefan Mandel fixou-se na Austrália, onde voltou a jogar na lotaria, desta vez de maneira diferente.

Como funciona

Na lotaria clássica, uma certa quantidade de números são escolhidos aleatoriamente e caso o jogador acerte nos números, ganha o jackpot.

As hipóteses de ganhar são, por isso, baseadas num número possível de combinações destes números que, geralmente, se encontram na casa dos muitos  milhões de combinações.

No entanto, Stefan Mandel apercebeu-se de algo: em algumas lotarias, o número total de combinações é significativamente inferior ao prémio do jackpot. E foi nesta teoria que o economista apostou todas as suas fichas.

Ou seja, se numa lotaria for necessário acertar em 6 números entre 1 e 40, como vimos acima, se o número de possíveis combinações é de 3,838,380.

Caso a lotaria pague 10 milhões euros pelo jackpot, em teoria, o jogador pode comprar todas as combinações possíveis por 1 euro, sabendo que num dos talões de jogo estará o grande prémio e um grande lucro.

O passo seguinte seria descobrir como conseguir preencher milhares de talões da lotaria, número a número.

Inicialmente, Mandel era obrigado a escrever à mão todas as combinações possíveis, arriscando-se a cair numa grande dívida se cometesse um erro.

Mas, neste passo, o aparecimento dos computadores pessoais viria a revolucionar todo o processo do economista, e Mandel criou um sistema que recorria a vários computadores e impressoras fiáveis que simplificavam todo o processo.

Outro dos problemas na estratégia de Mandel e um dos seus maiores receios, era a possibilidade de haver mais do que um vencedor no grande prémio.

Nessa situação, Stefan Mandel veria o seu prémio final diminuir drasticamente com a divisão dos ganhos, podendo não ganhar o suficiente para cobrir a dívida da compra dos bilhetes – razão pela qual optou por apenas apostar quando o jackpot pagasse pelo menos o triplo do custo de todas as combinações possíveis.

Durante os anos 80, Stefan e os investidores aguardavam que uma lotaria atingisse um prémio superior ao triplo do custo total das combinações e avançavam para a compra maciça de bilhetes.

Com este esquema, conseguiram ganhar 12 grandes lotarias e ainda 350 mil euros em pequenos prémios na Austrália e em Inglaterra.

Toda a gente me dizia que não iria conseguir. Agora as vozes que me rotulavam de sonhador foram silenciadas”, contou na altura Stefan Mandel a um jornal romeno.

Contudo, apesar de teoricamente infalível, o sistema do economista acabaria por chegar ao fim.

Em primeiro lugar, porque o risco que corria era grande para os lucros modestos que tinha. Em 1987, num prémio de 1 milhão e 100 mil euros, depois de pagar aos investidores, lucrou pouco mais de 80 mil euros.

Além disso, as vitórias sucessivas e os grandes prémios ganhos por Mandel, apesar de terem sido obtidos de forma legal, chamaram a atenção das autoridades australianas responsáveis pelo jogo, que mudaram a lei várias vezes para tentar impedir que o algoritmo de Mandel funcionasse.

No final da década de 80, os bilhetes impressos por computador e a compra em massa de bilhetes por um só individuo foram proibidas na Austrália, dificultando as ações de Mandel.

O romeno usou então os fundos que tinha para, mantendo a sede da sua operação em Melbourne, focar as suas atenções na Virgínia — estado norte-americano em que a lotaria só usava números entre 1 e 44, tornando o número de combinações possíveis milhões de vezes mais baixo do que o de outras lotarias.

Mandel criou uma empresa oficial, a Pacific Financial Resources, e um fundo gerido pela mesma, o International Lotto Fund. Seguidamente, convenceu milhares de investidores a financiar o fundo com milhões de dólares.

Com uma equipa permanente de 16 pessoas, o economista usou o seu método para imprimir sete milhões de bilhetes de lotaria ao longo de três meses, que enviou para um associado nos EUA.

O grupo teve sorte, ganhou um primeiro prémio de quase 25 milhões de euros e  vários prémios menores.

Mais uma vez, os métodos de Mandel não eram ilegais, mas levantaram muitas suspeitas junto das autoridades. Além disso, o romeno lucrou milhões com os seus ganhos, mas os seus investidores ficaram com menos dinheiro do que o esperado.

O romeno viu-se envolvido em batalhas legais durante quatro anos, acabando por ser absolvido de qualquer irregularidade — mas que lhe causaram grandes problemas financeiros. Em 1995, Mandel acabou por declarar falência.

O seu legado ficou para sempre marcado na legislação americana de jogos a dinheiro, onde os 44 estados que permitem lotaria promulgaram leis que impedem a replicação da sua louca estratégia milionária.

Atualmente,  Stefan Mandel vive na ilha tropical de Vanuatu, na costa da Austrália. Sem dinheiro, mas sem arrependimentos.

“Sou um homem que arrisca, mas de forma calculada,” disse Mandel ao jornal romeno Bursa em 2012. “Fazer a barba é uma lotaria: há sempre a possibilidade de me cortar, contrair uma infeção no sangue e morrer — mas faço-o de qualquer forma. As probabilidades estão a meu favor.”

ZAP //

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