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Maioria das medidas que não avançaram com o PEC IV já foi adoptada

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José Goulão / Flickr

Ex-primeiro ministro e líder do PS, José Sócrates

Ex-primeiro ministro e líder do PS, José Sócrates

O Programa de Estabilidade e Crescimento IV (PEC IV), assinado em Março de 2011, incluía dezenas de medidas até 2013. Apesar de o documento ter sido chumbado no parlamento, conduzindo à demissão do Governo socialista, as principais reformas foram implementadas.

As medidas de consolidação orçamental previstas para 2011, 2012 e 2013 tinham como objectivos “assegurar a trajectória de ajustamento anunciada em Maio de 2010, prosseguindo a consolidação das contas públicas, desenvolver a agenda de reformas estruturais, aprofundando-as, tendo em vista a promoção do crescimento económico e a correcção dos desequilíbrios macroeconómicos e reforçar o sector financeiro, promovendo a melhoria das condições de financiamento da economia portuguesa”.

O documento foi chumbado a 23 de Março de 2011, o dia em que José Sócrates apresentou a demissão do cargo de primeiro-ministro ao Presidente da República.

Rejeitada no parlamento por toda a oposição ao Governo do PS, a maioria das medidas do PEC IV acabou por fazer o seu caminho.

Eis a principais medidas do PEC IV implementadas pelo Governo de coligação PSD/CDS:

 Trabalho

O PEC IV estabelecia a redução das indemnizações compensatórias para 20 dias por cada ano de trabalho.

A medida acabaria por ser aplicada e ultrapassada já que o número acabou por cair para os 12 dias por ano de antiguidade. Os novos contratos permanentes passaram a ter um limite de 12 dias por cada ano de trabalho e, para todos os outros contratos, o limite passou a ser de 18 dias por cada ano de serviço nos três primeiros anos e de 12 dias por cada ano de antiguidade nos seguintes.

O PEC IV previa também “alterações no regime do subsídio de emprego, reforçando os incentivos para a aceitação de ofertas de emprego e restringindo as durações máximas e as taxas de substituição associadas a estas prestações”.

O Governo PSD/CDS adoptou uma taxa de 6% sobre o subsídio de desemprego e uma taxa de 5% sobre o subsídio de doença, uma medida que o Tribunal Constitucional chumbou, mas que o executivo recuperou, salvaguardando as prestações mais baixas.

Salários e pensões

O PEC IV referia que “não existem compromissos de aumentos adicionais” do salário mínimo nacional e que “qualquer decisão será também condicionada pela situação económica” do país.

O salário mínimo nacional está congelado nos 485 euros desde 2011 tendo recentemente o Governo manifestado abertura para negociar, dentro de um pacote de alterações laborais mais alargado, o descongelamento do salário mínimo.

Quanto às pensões, o PEC IV estabelecia que “será alargado o âmbito de aplicação da Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES), criada em 2010” aplicada a pensões acima dos 1.500 euros. A CES foi aplicada a pensões superiores a 1.500 euros tanto em 2011 como em 2012 e, no ano seguinte, o limite a partir do qual passou a ser aplicada a taxa de 3,5% foi reduzido, para os 1.350 euros.

Em 2014, o limite voltou a ser reduzido e passou a aplicar-se a pensões a partir dos 1.000 euros, tendo sido também alargada a base de incidência das taxas marginais aplicadas às pensões mais elevadas.

Impostos

No PEC IV, estava prevista a redução e a limitação dos benefícios e deduções fiscais em sede de IRS e de IRC, a revisão das tabelas do IVA, dos impostos sobre a energia e dos impostos específicos sobre o consumo, bem como a convergência das pensões e dos rendimentos do trabalho em sede de IRS e o reforço da emissão de facturas. Tudo isto já foi feito.

No IRS, por exemplo, comprar casa com recurso a crédito passou a ter menos benefícios fiscais: as deduções dos créditos à habitação contraídos até ao final de 2011 reduziram-se e, a partir daí, deixou de ser possível abater no IRS as amortizações dos empréstimos. Além disso, em 2013, o Governo reduziu o valor da parcela a abater no rendimento colectável, fazendo com que o imposto incida sobre um rendimento mais elevado.

Em sentido contrário, o IRC foi alvo de reforma em 2013: a taxa passou de 25% para 23% e o objectivo é reduzi-la para os 19% em 2018, tendo sido criada uma taxa reduzida de 17% para as empresas com lucros até 15 mil euros. Foi também alterado o regime da derrama estadual: as empresas com lucros de 35 milhões de euros passaram a pagar uma taxa de 7%, as que têm lucros superiores a 7,5 milhões de euros pagam uma derrama de 5% e as que têm lucros entre os 1,5 milhões e os 7,5% milhões pagam uma taxa de 3%.

A reforma do IRC eliminou ainda o regime de dupla tributação, ficando definido que a distribuição de dividendos e mais-valias fica isenta do pagamento do imposto desde que o sócio que os recebe detenha uma participação mínima de 5% durante 24 meses consecutivos.

No IVA, em Novembro de 2011, o Governo aumentou a taxa aplicada na restauração dos 13% para os 23% e reviu a tabela de bens, passando o imposto de 6% para 13% em bens como as bebidas e as sobremesas lácteas, a batata fresca descascada, os refrigerantes e os bilhetes para jogos de futebol, por exemplo. As conservas de frutas, os frutos e produtos hortícolas, os óleos e margarinas alimentares, o café e as refeições prontas passaram de uma taxa de IVA de 13% para 23%.

Os impostos ao consumo, como o aplicado ao tabaco e aos produtos petrolíferos, têm vindo a aumentar todos os anos.

Reforma orçamental

O PEC IV previa a revisão da Lei de Enquadramento Orçamental, para que a estrutura do Orçamento do Estado tivesse um enfoque em programas, mas também para criar um quadro orçamental plurianual e introduzir regras orçamentais sobre a despesa e o saldo orçamental.

Na sétima revisão da LEO, publicada em Diário da República em junho de 2013, foi introduzida a chamada ‘regra de ouro’, que determina que o défice estrutural não pode exceder os 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) e foi estabelecido que, quando o rácio da dívida pública superar os 60% do PIB, o Governo está obrigado a reduzir o montante excedente da dívida pública a uma taxa de um vigésimo por ano.

Além disso, tal como estava definido no PEC IV, foi criado o Conselho de Finanças Públicas e uma entidade de monitorização das Parcerias Público-Privadas (PPP).

Educação

Na área da educação, o PEC IV previa genericamente a reorganização dos agrupamentos escolares e a conclusão do processo de encerramento das escolas do 1.º ciclo com menos de 21 alunos. Em abril do ano passado, o Ministério da Educação e Ciência dava por concluído o ‘dossiê’ de fusão de escolas, tendo criado mais de 300 agrupamentos, alguns dos quais com mais de três mil alunos. No total, passou a haver 811 unidades orgânicas, entre escolas não agrupadas e agrupamentos.

Igualmente previsto no PEC IV estava o encerramento de cerca de 600 escolas do 1.º ciclo com menos de 21 alunos, número que foi mesmo ultrapassado: os últimos números da tutela indicam que, desde 2011, foram encerradas 612 escolas.

Saúde

Um dos aspetos contemplados no PEC IV era a redução dos custos operacionais dos hospitais EPE: entre 2011 e 2012, o Serviço Nacional de Saúde transferiu menos 210,3 milhões de euros para estas entidades, o que traduz uma redução de 4,7% no seu financiamento.

Além disso, no mesmo período verificou-se uma diminuição de custos com pessoal, medicamentos e fornecimentos, que permitiram reduzir os prejuízos dos hospitais em 38 milhões de euros, e foram reforçados os seus orçamentos com uma verba excepcional para pagamentos de dívidas em atraso a fornecedores no valor de 1.500 milhões de euros. A redução dos encargos com os hospitais EPE era uma das medidas na área da saúde que estavam previstas no PEC IV.

Outra das medidas mais emblemáticas no sector da saúde já consagradas no PEC IV era a “racionalização e redução dos encargos” da ADSE e outros subsistemas de saúde ainda existentes. Em Janeiro deste ano, o Governo decidiu aumentar, de 2,5% para 3,5%, os descontos para a ADSE, ADM e SAD, os subsistemas de saúde dos funcionários públicos, dos militares e dos polícias, respectivamente. A medida suscitou dúvidas ao Presidente da República, que a devolveu ao executivo, mas o Governo não fez alterações ao diploma, que foi entretanto aprovado pela maioria no parlamento.

Justiça

Entre as reformas preconizadas pelo Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC) IV para a área da Justiça contavam-se a reorganização dos tribunais, o combate às pendências e a melhoria do regime de insolvências, que o Ministério da Justiça cumpriu integralmente o memorando de entendimento estabelecido pela ‘troika’.

Transportes

O PEC IV previa a “racionalização da governação das empresas públicas do sector dos transportes, objectivando a redução de custos operacionais e uma maior racionalidade na oferta de serviços”.

Apesar de o documento não ter sido aprovado, o actual Governo pôs em marcha uma reestruturação das empresas públicas de transportes, que resultou em aumentos dos preços dos títulos de transporte, redução dos serviços, diminuição do número de trabalhadores e greves feitas pelos funcionários das transportadoras em resposta a estas medidas e aos cortes nas remunerações e regalias.

Energia

O PEC IV estabelecia uma revisão dos “direitos especiais detidos pelo Estado sobre empresas privadas”, no sentido de “abolir esses direitos”. O fim das chamadas ‘golden share’ na PT, na EDP e na Galp foi das primeiras medidas do programa de ajustamento de Portugal, tendo sido aprovado em Conselho de Ministros logo em Julho de 2011.

Banca

No PEC IV estava a obrigação de os bancos reforçarem os seus capitais, um esforço que a ‘troika’ elevaria: o rácio mínimo de ‘core tier 1’ de 8% (uma das medidas de avaliar a solvabilidade de uma instituição financeira) passou para 9% em 2011 e para 10% em 2012.

O PEC IV dizia ainda que os bancos deviam reduzir o endividamento e a dependência do financiamento do Banco Central Europeu. A ‘troika’ impôs mesmo que os bancos diminuíssem o rácio de transformação de depósitos em crédito para o máximo 120%. Já o financiamento do BCE continua a ser uma das principais fontes dos bancos portugueses, embora esteja em mínimos de quase três meses.

Além disso, era ainda referido o caso do BPN, comprometendo-se o Governo a apresentar até final de Maio de 2011 um plano, sujeito a aprovação de Bruxelas, para “resolver a situação”. O memorando de entendimento foi mais longe, ao exigir ao Executivo que encontrasse um comprador até final de Julho ou o banco seria liquidado. O Banco BIC comprou o BPN por 40 milhões de euros.

Sector Empresarial do Estado

O PEC IV definia a reestruturação dos serviços e organismos da administração central do Estado, “mediante extinção, fusão ou externalização de estruturas administrativas” e previa a “supressão de 991 cargos dirigentes superiores, intermédios e equiparados, correspondendo a 15% do seu universo global”.

De acordo com os números do emprego público, publicados pela Direcção-Geral da Administração e do Emprego Público, no final de 2011, a administração central empregava 6.720 dirigentes superiores e intermédios e, em 2013, empregava 6.232 quadros destas categorias, uma redução de 488 trabalhadores em três anos, ou seja, de 7,3%.

/Lusa

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