Formação de Andrómeda pode ter sido mais violenta que a da Via Láctea

Um estudo detalhado dos movimentos de diferentes populações estelares no disco da Galáxia de Andrómeda encontrou diferenças marcantes em relação à nossa própria Via Láctea, sugerindo uma história mais violenta de fusões com galáxias mais pequenas no passado recente de Andrómeda.

A estrutura interna e os movimentos do disco estelar de uma galáxia espiral possuem informações importantes para a compreensão da história de formação dessa galáxia. A Galáxia de Andrómeda, também chamada M31, é a galáxia espiral mais próxima da Via Láctea no Grupo Local.

“Em Andrómeda temos a combinação única de uma visão global e detalhada de uma galáxia parecida com a nossa. Temos muitos detalhes na nossa própria Via Láctea, mas não temos uma perspetiva global e externa”, afirma Puragra Guhathakurta, professor de astronomia e astrofísica da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, EUA.

O novo estudo, liderado por Guhathakurta e por Claire Dorman, estudante de doutoramento da mesma universidade, combina dados de dois grandes levantamentos de estrelas em Andrómeda, um realizado no Observatório no Observatório W. M. Keck no Hawaii e o outro usando o Telescópio Espacial Hubble.

O estudo SPLASH (Spectroscopic and Photometric Landscape of Andromeda’s Stellar Halo) usou o espectrógrafo multiobjecto do Keck/DEIMOS para medir as velocidades radiais de mais de 10.000 estrelas brilhantes e individuais em Andrómeda. O recém-concluído estudo PHAT (Panchromatic Hubble Andromeda Treasury) fornece imagens de alta-resolução em seis comprimentos de onda diferentes para mais de metade dessas estrelas.

“A alta-resolução das imagens do Hubble permite-nos separar estrelas no disco lotado de Andrómeda, e a grande cobertura em diversos comprimentos de onda permite-nos subdividir as estrelas em subgrupos de acordo com a idade,” afirma Dorman, que apresentou os achados quinta-feira passada, 8 de janeiro, na reunião de inverno da Sociedade Astronómica Americana em Seattle. O estudo exibe a velocidade e dispersão de estrelas jovens, de idade média e velhas no disco de Andrómeda, o primeiro do género numa galáxia que não a nossa.

A análise de Dorman revelou uma tendência clara em relação à idade estelar, em que as estrelas mais jovens mostram um movimento relativamente ordeiro em torno do centro da Galáxia de Andrómeda, enquanto as estrelas mais velhas exibem movimentos muito mais desordenados. As estrelas da população “bem comportada” movem-se de forma coerente, quase com a mesma velocidade, e as estrelas da população desordeira têm uma gama maior de velocidades, o que implica uma maior dispersão espacial.

“Se pudéssemos olhar para o disco de lado, a população coerente de estrelas bem-ordenadas situar-se-ia num plano muito delgado, enquanto as estrelas da população desordeira formariam uma camada muito mais ‘inchada’,” explicou Dorman.

Perturbação ou assentamento?

Os investigadores consideraram cenários diferentes de formação e evolução do disco galáctico para explicar as suas observações.

Um cenário envolve a perturbação gradual de um disco pacato de estrelas como resultado de fusões com pequenas galáxias-satélite. Estudos anteriores encontraram evidências de tais fusões em correntes estelares de maré no halo prolongado de Andrómeda, que parecem ser restos de galáxias anãs canibalizadas.

Segundo Dorman, as estrelas dessas galáxias podem também sofrer acreção na direção do disco, mas a acreção por si só não consegue explicar o aumento observado na velocidade de dispersão em relação à idade estelar.

Um cenário alternativo envolve a formação do disco estelar a partir de um disco inicialmente espesso e “grumoso” de gás que gradualmente assentou. As estrelas mais velhas formaram-se enquanto o disco de gás estava ainda numa configuração inchada e desordenada. Ao longo do tempo, o disco de gás assentaria numa configuração mais fina com movimento mais ordenado, e as estrelas mais jovens formar-se-iam no disco com uma configuração também mais pacífica.

Dorman explica que a combinação destes mecanismos pode explicar as observações da equipa. “As nossas descobertas motivam os teóricos a realizar simulações de computador mais detalhadas destes cenários”, acrescenta.

A comparação com a Via Láctea revelou diferenças substanciais que sugerem que Andrómeda teve uma história de acreção mais violenta no passado recente. “Mesmo as estrelas mais bem ordenadas de Andrómeda não estão tão bem ordenadas como as estrelas no disco da Via Láctea“, considera Dorman.

No paradigma atualmente favorecido da formação de estruturas no Universo, pensa-se que galáxias como Andrómeda e a Via Láctea cresceram graças à canibalização de galáxias-satélite mais pequenas e pela acreção das suas estrelas e gás. Os cosmólogos preveem que 70% dos discos do tamanho do de Andrómeda e do da Via Láctea devem ter interagido com pelo menos uma galáxia-satélite de tamanho considerável nos últimos 8 mil milhões de anos. O disco da Via Láctea é demasiado bem ordenado para isso ter acontecido, enquanto o de Andrómeda encaixa muito melhor na previsão.

“Neste contexto, o movimento das estrelas no disco de Andrómeda é mais normal, e a Via Láctea pode simplesmente ser um outlier (caso atípico) com uma história de acreção invulgarmente quiescente,” conclui Guhathakurta.

CCVAlg

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